Lá, atrás no tempo - por Christina Hernandes

Lá, atrás no tempo - por Christina  Hernandes

Lá, atrás no tempo

 

Entre duas grandes avenidas nasceu meu bairro. Ruas de terra batida, pessoas simples, casas na avenida principal de construção antiga, provavelmente arquitetura dos anos 40, sem grandes detalhes.

As famílias que lá residiam desde sua formação, eram felizes apesar da lonjura do bairro para o centro da cidade.

O que mais me chamou atenção, quando me mudei para lá, foi a preocupação inicial, com a preservação das árvores centenárias.

Lembro-me de uma em particular, uma quaresmeira de flores roxas, penso tinha mais de cem anos, tronco com mais de  metro de largura, altura não saberia precisar, sua copa sombreava quase tudo; reinava solitária no meio da avenida de terra batida.

Ela foi acompanhando lenta e tristemente o avanço e mudanças ao seu redor, o asfalto chegando sem pedir licença, a calçada ao seu redor espremendo suas imensas raízes, e o semáforo mudança de cor a todo o instante prejudicando seu descanso noturno, confundindo-a na contemplação das estrelas e da Lua, nas noites mais lindas daquele pedaço.

Mesmo assim, correndo todos os riscos, continuava frondosa, generosa, nos dando sua enorme sombra, energia sem fim, e até nos presenteando com suas flores, sem pedir nada em troca.

Certamente uma rainha cuidando de todos com carinho, preocupação, dando-nos sua seiva que nutria todos que por ela passavam contemplando aquele lugar mágico, de uma energia que perpetua.

Sábia! Já compreendia o que, nós moradores do bairro, com toda nossa arrogância e sabedoria, não alcançamos, o futuro.

 

Dia a dia ela foi definhando, foi apontando seu martírio, mas não pudemos enxergar, não tínhamos tempo, aliás o tempo urgia, enfim ela era somente uma árvore, linda mas uma árvore.

Lentamente ela foi partindo, lentamente seu espaço foi sendo invadido pela avenida e a calçada que insistíamos em construir cada vez mais próxima de suas imensas, fortes e poderosos raízes que saiam da terra denunciando sua virilidade.

Ah, como fomos cegos! Como não pudemos entender o que ela nos dizia! Ela partia...

Agonizava heroicamente sem reclamar, sem cobrar nada, sem nos agredir, partia silenciosamente.

Hoje jaz no lugar somente sua lembrança, sua silhueta gravada na nossa memória,  no nosso passado como uma marca que não se apagará, acolhida com culpa em nossa alma com nosso remorso, nossa saudade e nossa dor.

 

 

 

 

 

Conheça outros parceiros da rede de divulgação "Divulga Escritor"!

 

           

 

 

Serviços Divulga Escritor:

Divulgar Livros:

 

Editoras parceiras Divulga Escritor