Os Sonhos de Maria - por Adriana Freitas

OS SONHOS DE MARIA

 

Maria era uma menina que quando criança gostava de observar a chuva cair. Adorava ver como as gotas caiam uma depois da outra e se espalhava no chão. Isso deu margem aos seus sonhos. Aos cinco anos Maria sonhava em ser professora de ginástica (ela desconhecia o personal trainer). Esse sonho tem um pouco a ver com as idas da sua mãe a academia para se exercitar. Esse desejo não durou muito.

            No ano seguinte, a menina passou a sonhar em ser médica, acho que toda criança, em algum momento da vida, sonha em ser médica ou veterinária. O sonho também logo mudou. Aos sete anos Maria teve seu sonho mais duradouro, o que não a impediu de ter outros sonhos. Esse sonho Maria não compartilhou com ninguém, sonhava em ser atriz, mas tinha medo que as pessoas rissem dela, então por estratégia, toda vez que alguém lhe perguntava o que ela queria ser quando crescer, a menina prontamente respondia que não sabia. Ela sempre soube, só não tinha coragem de dizer.

            Os anos foram passando, mas este sonho persistia em silêncio. Ela também sonhou em ser cantora, o que não a impediria de atuar. Uma espécie daquelas atrizes cantoras, ou coisa parecida. Criou tantas histórias em sua mente, todas as noites antes de dormir, a menina sonhava que atuava em superproduções, eram tantas histórias, que ela poderia ter escrito um livro. Porém, Maria tinha medo de contar esses sonhos às pessoas, então à menina continuava a sonhar em silêncio.

            Aos nove anos, Maria também sonhou em ser paquita da Xuxa.  Apenas existia um problema para a menina, ela morava no nordeste, como então ela realizaria esse sonho? Em seus pensamentos seu pai seria transferido para o Rio de Janeiro, sendo assim, seria fácil para ela se tornar uma das ajudantes de palco da Xuxa, atuar em filmes e cantar. O mais perto que Maria chegou de sua realização foi quando em um trabalho beneficente do seu colégio em uma igreja da cidade, algumas meninas da sua idade iriam fazer uma apresentação cover da Xuxa e como faltava alguém e Maria coincidentemente estava vestida parecida com as outras meninas, ela foi convidada a se apresentar. Foi paquita cover, mas se apresentou como tal. Aos dez anos, Maria caiu na real, seu pai nunca iria ser transferido, ela não seria paquita.

            No entanto, a menina não parou com os seus sonhos, paralelamente a vontade de ser atriz e cantora, a menina quis ser jogadora de Vôlei. Nunca teve muita altura para isso, mas por que não? Esse sonho Maria pode contar. No seu colégio existia uma escolinha de vôlei, ela não teve dificuldades de se matricular e foi aprender a jogar. Passou um ano na escolinha, o que não a impediu também de fazer judô, foi apenas por alguns meses, mas era outra possibilidade para ela. Ser atleta e ser artista também seria bom.

            No ano seguinte, aos doze anos, Maria parou com o vôlei e começou a jogar handball no time mirim do seu colégio. No entanto como não tinha muitas habilidades com as mãos, o que lhe restou foi o gol. Foi uma experiência boa para ela, apesar de às vezes ser chamada de goleira “frangueira”. Era difícil agarrar principalmente, quando tinha meninos observando os treinos e as meninas queriam se mostrar para eles atacando a goleira, soltando “bombas” em sua direção. Mesmo assim, Maria foi titular, isso porque a outra goleira não tinha idade suficiente para os campeonatos, mas conseguiu ser bicampeã municipal. Maria era boa em agarrar sete metros (uma espécie de pênalti no handball) e não era “frangueira” nos jogos não, o seu problema era com os treinos. Nesse período de dois anos, Maria sonhou em ser jogadora profissional de handball, ela queria era ser atacante, mas tinha medo de sair com a bola, como seria isso, eu não sei.

            Durante esse período Maria também sonhou em cantar numa banda de rock, passou a ensaiar alguns versos, sempre gostou de poesias, porém como tudo na vida dela, foi mais um sonho que passou.  Após dois anos jogando pelo colégio, Maria e seus irmãos saíram dessa escola e foram para outra. Nesse novo colégio não existia time feminino de nada, então Maria continuou a treinar no seu antigo colégio, agora era vôlei, não mais handball. Não passou muito tempo. As suas investidas atléticas haviam acabado, mas não o sonho de ser atriz. Mas Maria ainda não se mexia para que esse sonho se tornasse real. Passaram- se os anos e nada de novo aconteciam em sua vida, nesse tempo mudou de colégio por mais duas vezes. Conheceu novas pessoas, não teve outros sonhos, apenas os antigos e a falta de coragem de compartilhá-lo persistiam. O problema de Maria era a timidez excessiva, a menina era tão tímida que às vezes nem falava, só ouvia as pessoas. E sempre tinha aquela pergunta que todo tímido detesta. : - Você é tímida? Ou você fala?

            Quase aos dezessete anos, Maria finalmente resolveu fazer um curso de teatro. Foi uma experiência libertadora, pela primeira vez, ela não tinha vergonha de dizer o que queria. Pela primeira vez ela pode sonhar de verdade. A sua timidez foi aliviada, mas o seu medo do que as pessoas pensariam dela não. Maria não se achava uma boa atriz, sempre sonhou com isso, mas quando chegou perto de realizar esse sonho, ela se viu bloqueada. Achava-se péssima e temia que as pessoas percebessem que ela era péssima. Maria se bloqueou e claro as pessoas perceberam isso. Depois de muito sofrimento e muito choro, ela conseguiu ensaiar as suas falas na peça de encerramento do curso. Conseguiu se apresentar e esse momento foi um êxtase em sua vida.

            Os anos foram passando e Maria sonhando, fez mais um curso, porque ainda precisaria de muitos, o sonho de cantar em uma banda de rock persistiu. No seu mais novo colégio, agora no último ano, ela quase realizou o sonho da banda. Maria já conseguia cantar com os amigos em rodinhas de violão e quase foi montada uma banda. Mesmo sonhando com isso, Maria iria conseguir um jeito de se sabotar. Ela sonhava, mas seu medo sempre foi mais forte do que tudo. Ela cantava em rodinhas com os amigos, mas a possibilidade de ensaio em um estúdio tirava-lhe o ar. No ano seguinte, finalmente conseguiu entrar num espetáculo, mas o bloqueio veio com tudo, e todo aquele sofrimento de novo e toda aquela agonia e mais uma vez, Maria conseguiu vencer tudo isso, ganhou mais personagens e ganhou mais sentido em sua vida. Os sonhos de apresentação e de turnê foram banhados com água bem fria, faltando poucos dias para estréia o elenco escutou do diretor que o teatro em que faria temporada entraria em reforma, e todos aqueles meses de ensaio e todos aqueles sonhos se reduziram a uma apresentação no colégio do irmão mais novo que Maria conseguiu vender, foi uma surpresa pra todos. E uma apresentação numa cidade do interior.

            Mesmo com todo medo, Maria teve mais uma chance, outro espetáculo, dessa vez, dentro da universidade, dessa vez, a coisa parecia mais séria. Mais uma vez bloqueio, mais uma vez sofrimento e sempre pelas mesmas razões. Medo. E mais uma vez superação. Ela foi elogiada em seu desempenho. Esse ano foi bom para Maria, estava trabalhando como atriz, havia finalmente entrado na universidade. Tudo finalmente parecia que ia dar certo. Maria fez alguns trabalhos na área, ela pôde finalmente se aproximar da realização do seu mais longo sonho. Porém a menina não conseguiu se desvencilhar do seu maior empecilho, o seu maior vilão. O medo. Maria tinha um medo que lhe paralisava as pernas. Sempre criava desculpas para fugir de um teste, sempre se sabotando. Então os anos foram passando e as chances dela foram indo embora. A maturidade chegou pra menina, agora Maria era uma mulher madura. Que sonhou tanto, mas que não correu atrás desse sonho, chegava perto e o seu medo não deixava nem ela falar. Maria não se entristece por não viver o que sonhou a vida inteira, afinal venceu o medo. O medo não a mais paralisa como antes. Mas ela não quer ser mais atriz, não quer ser mais cantora, atleta, não sonha mais com nada disso. Agora Maria é contadora de histórias.

 

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