A Concepção de cura no "primeiro Alcibíades" de Platão - por Carlos Vargas

A Concepção de cura no "primeiro Alcibíades" de Platão - por Carlos Vargas

A CONCEPÇÃO DE CURA NO “PRIMEIRO ALCIBÍADES” DE PLATÃO

Carlos Vargas

 

Partindo de uma das reflexões platônicas sobre a doença no diálogo “Timeu”, onde se afirma que “a maior das enfermidades é a ignorância” (Timeu, 88b), é possível desenvolver o tema da cura como libertação da escravidão tal como foi apresentada no diálogo “Primeiro Alcibíades”. Nesse diálogo, lido com algumas técnicas de interpretação platônica emprestadas de Paul Friedländer e Victor Goldschmidt, percebe-se que Sócrates faz o jovem Alcibíades reconhecer sua ignorância e buscar libertar-se pelo caminho do autoconhecimento, o que implica no conhecimento dos outros e no conhecimento dos “deuses”.

O dialogo expressa um aspecto educativo da filosofia platônica. Sócrates procura convencer o jovem Alcibíades de que, além da educação política propriamente dita sobre os assuntos da cidade (Alcibíades, 133c), é preciso “cuidar da alma” (Alcibíades, 133c). Sócrates faz a comparação com à cura de uma enfermidade:

“Suponha um ser humano enfermo que possa fazer o que quiser sem seguir os conselhos médicos...? O que resultará de sua ação? Não é mais provável que acabe com a sua saúde?” (Alcibíades, 135d).

No “Alcibíades”, este estado de escravidão é caracterizado pela “perversidade”. Alcibíades desejava ser um senhor poderoso, mas estaria escravizado enquanto não buscasse o caminho do conhecimento que Sócrates lhe indicava. É preciso reconhecer-se necessitado de cura, o que Sócrates faz por meio de seu método dialético: “Percebes agora teu próprio estado; és realmente um homem livre? E sabes como libertar-te de teu estado atual?” (Alcibíades, 135e). Visando este objetivo, a recomendação prática de Sócrates a Alcibíades é a busca do autoconhecimento, o qual “temos concordado em chamar de sabedoria” (Alcibíades, 134a). A busca da felicidade exige sabedoria e bondade.

Entretanto, há necessidade de ajuda para a cura. Nesse sentido, Sócrates e Alcibíades estabelecem uma amizade para aperfeiçoar o autoconhecimento, pois “se o olho quer ver a si mesmo, terá que dirigir seu olhar a outro olho” (Alcibíades, 134a). Por um lado, Alcibíades promete se conhecer e, assim, colaborar: “eu tomarei o teu papel e tu tomarás o meu” (Alcibíades, 135e). Por outro lado, Sócrates, mesmo com sua modéstia (Alcibíades, 135e), assume o papel de uma espécie de terapeuta: “Então, querido, [...] tenho abrigado no ninho da tua alma um amor alado” (Alcibíades, 135e). Na amizade “terapêutica”, amar o outro é querer a sua libertação (Alcibíades, 131d).

Finalmente, na terceira via de cura ou autoconhecimento, Sócrates se refere à divindade. Ao tratar-se da cura, pode-se olhar esta referência “teológica” na perspectiva de antropologia na qual o ser humano participa de um destino que lhe transcende:

“E assim como os espelhos reais são mais claros, mais puros e mais luminosos que o espelho de nossos olhos, assim também a divindade é mais pura e mais luminosa que a parte melhor de nossa alma. [...] Mirando, pois, a divindade, nos servimos do melhor espelho das coisas humanas a respeito da virtude da alma e, assim, nele, vemos e conhecemos melhor a nós mesmos” (Alcibíades, 134b).

Na concepção platônica, o sujeito curado, na medida do possível, assimila em si e obedece aquilo que conhece no caminho da justiça, no qual Alcibíades se propôs a começar (Alcibíades, 135e). Além das doenças corporais, Platão percebe a doença da alma e apresenta sua concepção de cura da alma: o conhecimento de si mesmo por meio dos espelhos das almas alheias e da divindade.

 

Publicado em 16/05/2014

 

 

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