Liberdade
A incrível sensação de liberdade que está inata em todo o ser humano, por nascermos livres. Deixamo-nos agrilhoar mais tarde. Logo assim que precede o nascimento, ficamos presos! Cativos no colo, no olhar, voz, protecção da mãe. É apenas o começo. Um terrível começo de cedências e de submissão. Quando ainda se continua a nascer mulher! Grato seja o tempo em que cada vez mais se contraria essa tendência. A mulher "grita", respira liberdade, nem sempre bem assumida ou usada, caindo-se nos sempre exagerados comportamentos de quem vive compartimentado. Essa servidão que inutiliza qualquer indício de revolta a que as nossas avós obedeceram, quando algumas já se sublevavam.
Conheciam a determinação na inutilidade de dias fechadas, saídas proibidas a trabalho ou lazer, vetado e condicionado na educação dos filhos, extremo cuidado com qualquer racionalidade de pensamento ou gesto. Este, seria logo à partida, condenado, muitas vezes com recurso à violência. Ainda assim a mulher começou a pensar por si, a querer mais a querer trabalhar, a ter direito à sua autonomia. Quando mulheres escreviam sob pseudónimo de homens, viam as suas obras aceites mas tinham de se esconder.
Quando dançavam, tocavam, não o queriam fazer como qualquer macaco amestrado, apenas para a sociedade, mas por gozo próprio. Quase nunca com o intuito de "aparecer" mas antes realizar-se. Independência, autonomia, racionalidade, respeito. Conquistados a pulso! Com sangue tantas vezes. Nos dias de hoje, ainda muito, com nódoas negras, choro e uma autêntica história de desgosto mas de uma força imensa. Sempre, livre! Talvez que eu tenha a sorte de viver hoje, dizendo-me fora do meu tempo, querendo viver lá atrás... Mas se fosse uma delas (condicionada, agrilhoada por preconceitos) morreria, gritando ou lutando.
Eu labuto, contrario, insurjo-me e inquieto-me e vou... Muitas vezes, sem saber se acertadamente, mas sigo. Nunca paro, para nunca me deixar parar. Abrandar quiçá por um pouco, mas ter mais força depois. A minha noção de liberdade é intensa. Sem ela, condenam-me àquela prisão de antes. Necessito de ser livre para ter ar, para ser eu, para criar algo, ou me espalhar ao comprido. Essencialmente levantar-me de seguida. Parar é morrer. São grilhões, são pesadas paredes que me sufocam. Por isso tenho de ir... Certa, ou erraticamente ser livre, é a natural forma de estar, amar e ter liberdade de escolha para mim. Para tantas como eu!
Quero parar quando me apetecer dizer... Chega! Dizer não, se já se cai no abuso. Sem liberdade todo o ser humano é reduzido a nada. Tentar prender-me é receber agressividade. Tentar calar-me é ver ironia no rosto. Tentar mudar-me é simplesmente impossível. E a ti?
Maria de Fátima Soares