Meus Complexos e Traumas em Cinco Atos (Bullying) - Quarto ATO - Por SILVA NETO

Meus Complexos e Traumas em Cinco Atos (Bullying) - Quarto ATO - Por SILVA NETO

Meus Complexos e Traumas em Cinco Atos (Bullying)

 Por SILVA NETO

 

QUARTO ATO:

...(Continuação)

 

No Clube do Leão XIII havia muitas festas, bailes, assustados, dancings, e eu não sabia dançar. Alguém teve a ideia, não por minha causa somente, mas por muitos que eram tímidos como eu de contratar uma dançarina, pé de valsa, para ensinar a dançar. Maravilha! Timidamente, candidatei-me.  Era uma jovem de quase trinta anos, benquista na sociedade pelos seus dotes de beleza e classe. Professora de boas maneiras ensinava candidatas à miss a desfilar e se portar socialmente diante de uma mesa, em festas, etc. Além de “arrasar” nos bailes como dançarina dava aulas particular de dança. Somente as senhoras tidas como respeitosas, religiosas consideravam-na prostituta pela liberalidade no modo de vestir e de se maquiar. Ela dançava e conversava com o cavalheiro, espécie de psicóloga, para abrir a cabeça dos jovens tímidos. Nas primeiras aulas fui mal, muito mal, pensei em desistir, mesmo porque minha cabeça chegava à cintura dela, mas, depois me soltei um pouco. O que aprendi foi suficiente para não fazer feio no salão, porém, precisava era curar minha  timidez. Como tirar uma menina para dançar? Naquele tempo o homem tinha a iniciativa. A mulher o máximo que podia era corresponder a uma piscada de olhos à distância quando queria dançar. Como não tinha coragem de tirar as  moças para dançar, tão pouco piscar para elas, geralmente passava em branco todo o baile. Algumas, quebrando a etiqueta, passavam por mim e davam-me um beliscão. Como o salão era escuro, criava coragem e arriscava, dançando uma, duas músicas e pronto.

 Nos bailes só tomava coca-cola. Uma noite, no escuro do salão, troquei o copo sem querer por um com Coca-Cola misturado com Rum Montilla, a famosa  “cuba libre”, da época. Achei gostoso e me empolguei. Quando havia tomado uns dois goles, eis que Raquel entra no Clube e foi direto ao salão dançar com o namorado. Não acreditei! Pensei que fosse fantasma ou efeito da bebida e aí não parei mais. Tomei uns quatro copos e como não tinha costume de beber fui parar na sala de repouso dos embriagados. Alguém me identificou lá, levando-me para casa. No dia seguinte houve comentários entre os colegas: —_Juanito, que passas?! Outros: Estás progredindo, amigo! Eu, com enorme ressaca, consolava-me, pois havia tido sonhos maravilhosos com a minha deusa.

Usava sapatos de saltos avantajados, mas, ainda não tinha comprado o famoso “Cavalo de Aço”. Em viagem ao Recife, fui a uma sapataria e matei minha vontade. Comprei um lindo sapato “Cavalo de Aço” que não tinha o salto maior porque meu pé era pequeno. Uns oito a dez centímetros a mais no meu tamanho até que não era mal. Aproveitei, fui a uma loja de Jeans, comprei uma calça Lee e uma camisa cacharrel branca. Nos bailes a luz negra refletia nessas camisas brancas dando uma tonalidade fluorescente azulada. Era o xodó da juventude na época. Meus cabelos já estavam nos ombros e meu pai não gostava nada disso. Mas era a moda, o que fazer? Não queria ser “boco moco” ( gíria usada na época para aqueles que eram antiquados). Voltando para casa levei a calça a uma costureira para abri-la e fazê-la “boca sino”. Estava progredindo mesmo!

   Os dias passavam e eu cada vez mais desenvolvido, fazia amizade nova a cada dia na escola técnica, no clube, nas “peladas”, na vida social da Cidade de Catende.  Tinha boa cultura e educação esmerada pelas minhas origens de bons colégios que passei. Não teria o que reclamar se não fosse a minha pequena estatura. Sempre perdia em quesitos como: Jogar bola em time oficial, Jogar vôlei, basquete, até desfilar pela escola técnica.

Um belo dia,  próximo ao Sete de Setembro as escolas já faziam seus ensaios para o desfile. Minha  Escola Técnica não nos obrigava a desfilar. Mas, naquele ano, haveria uma comissão julgadora para premiar o melhor desfile entre as escolas e colégios de Catende. Além da Banda Marcial seria necessária uma boa representação de contingente de alunos, e bastante criatividade para surpreender à Comissão. Mais um pesadelo a enfrentar! Lembrei-me do Colégio Diocesano de Garanhuns. Só pensava em desfilar lá atrás entre os menores dos menores, por ser pequeno, embora, na atual situação, tratava-se de um desfile entre rapazes e moças e não meninos de dez anos. Os rapazes falavam grossos e tinham barbas como eu. Ora, havia desfilado tantas vezes no Colégio Diocesano em condições bem piores que aquelas!

Achava linda a Banda Marcial. Era um sonho  desfilar tocando um instrumento, seja de percussão ou de som. Existiam  cornetas,  pratos,  tarôs, bombos e tantos outros instrumentos pequenos! Aureni, um rapaz muito engraçado, teve a ideia de arranjar um bombo daqueles que usam vertical colocado no peito e com duas faces laterais para bater de um lado  e outro. Contudo, aquele bombo era muito grande e pesado. Se colocassem em mim eu cairia para frente ou o arrastaria no chão. Foi quando meu amigo Antônio deu uma ideia: _ Vamos buscar o bobinho da banda infantil?! Faltavam dois dias para o  ensaio geral. Colocaram-me em frente à banda marcial com o bombinho vertical infantil, puxando o desfile. O bombo pesado ficou com Aureni. No dia do desfile foi bastante engraçado. Deram-me o itinerário e lá vou eu imponente, guiando a tropa, parecendo Napoleão Bonaparte, todo empolgado. Tom!...Tom!...Tom! Suava frio, mas, não sabia que minha popularidade daí pra frente teria grande repercussão positivo, Foi um sucesso o desfile, ficamos em segundo lugar na classificação geral. Só não gostei do apelido que me colocaram daí pra frente: “João Bombinho”.

Quanto a Raquel, acompanhei sua vida até aos dezenove anos, quando casou: foi baliza nos desfiles de sua Escola (aquela que desfila a frente da banca marcial) dos seis aos dez anos. Aos onze, seus pais não mais a consentiram desfilar como baliza. Era uma moça linda, de pernas torneadas e grossas, poderia suscitar libido entre os homens, por isso os pais vetaram sua participação. Aos quinze, Rainha da primavera, Rainha do Milho aos dezessete; indicada para representar a cidade no concurso de Miss aos dezoito, sendo mais uma vez vetada pelos pais e o namorado.

No ano seguinte, eu cursando o segundo ano do curso técnico, já totalmente ambientado e só dava alguma recaída quando via Raquel. Meu coração chegava a mil quando ela adentrava no mesmo ambiente que eu. Não a cumprimentava por minha inteira culpa, pois, não conseguia fitar seus lindos olhos. Lembro-me bem de um trecho de uma poesia “A Mandinga” de MENOTTI DEL PICCHIA (1892/1988) que dizia assim:

 Juca Mulato! Esquece o olhar inatingível! 
 Não há cura, ai de ti, para o amor impossível. 
Arranco a lepra do corpo, estirpo da alma o tédio, 
só para o mal de amor nunca encontrei remédio... 
Como queres possuir o límpido olhar dela ? 
TU ÉS QUAL O SAPO A QUERER UMA ESTRELA

Nunca mais esqueci esta frase: ”TU ÉS QUAL UM SAPO A QUERER UMA ESTRELA”. Até serviu para realmente deixar de pensar em Raquel. Reconhecia minhas condições desfavoráveis, minha pequenez. Seu Noivo era alto e filho do homem mais rico da Cidade. Não poderia competir. Eu apenas trabalhava no Sindicato do Comércio de Catende e dava graças a Deus pelo Salário Mínimo que recebia. Com ele, pagava a escola, ia ao cinema, pagava o Clube, comprava meus “Cavalos de Aço”, calças “Boca sinos” e camisas de malhas agora na moda. Ainda tomava uma “Cuba Libre” vez em quando.

O Mês de maio chegava. Corria o boato que Raquel ia se casar. Cidade pequena é assim em todo o planeta, todos sabem de tudo e quando não sabem inventam e espalham boatos, mas, era verdade. Era “o fim da picada” saber que minha paixão enrustida ia se casar com outro. Então minhas tias mentiam quando diziam que nós íamos nos casar quando crescesse?! O fato é que Raquel cresceu e eu não, portanto, minhas tias não mentiram. Consolava-me saber que corria boato que ela ia se casar sem gostar dele. Fui à forra com isso! —Será que ela é apaixonada por mim?! Era muita pretensão minha àquelas alturas!

No dia do casamento foi hilário. Era um dia de domingo e o casamento antes da missa das cinco da tarde. Fui à Igreja pela manhã para assistir à  missa dominical. Não assistia missas diariamente, isso só acontecia quando era seminarista. Poderia até deixar para assistir a missa à tarde, pelo menos via a noiva. Mas, nem pensar, seria uma facada no meu coração ver aquela linda mulher vestida de noiva para outro homem. Assim, fui ao BAR DO COLAÇO que ficava em frente à Igreja, depois da praça. De lá podia ver o movimento dos convidados e quando a noiva chegasse e saísse da Igreja depois do casamento. O coração apertava à medida que se aglomerava gente em frente à Igreja. Tomava apenas Coca-Cola. De repente a noiva chegou num Aero Willis preto, desceu do carro, sendo ladeada pelas portas alianças, uma garota e um garoto vestidos a critério. Não dava para vê-la em detalhes, mas, sua beleza resplandecia. O vestido de cauda longa escorregava pelos degraus da calçada, os convidados em volta no cortejo adentravam a Igreja. Meu coração a mil só pensava em uma coisa, um milagre até, o de ver a noiva saindo da Igreja correndo, quando na hora do sim dissesse não, desistindo de casar. Tolice minha, Isso não aconteceria nem por milagre. A essas alturas eu já tinha mudado de bebida. Já havia tomado uns três copos de “Cuba Libre”. O dono do Bar, Sr Colaço, não estava, e sim o Juninho, filho dele. Jogava bola com ele, por isso deixou-me beber tanto naquele dia. Quando a Noiva saiu da Igreja já não via mais nada. Estava tudo embaçado: a praça, os jardins, as flores, misturava tudo com a beleza dela. Repetia constantemente com fala engrolada de pileque, minha deusa! Minha deusa! Quando dois amigos  entraram no Bar, Aureni e Zé Pedro, carregando-me para casa contra minha própria vontade. Queria ficar ali, registrando na mente aquela triste sena: uma mulher se casando com outro e o apaixonado tomando todas em um bar.  Era a segunda vez que isso acontecia, a  primeira foi no Clube. Minha mãe só faltou morrer de vergonha. Como meu pai estava em São Paulo há quase um ano, (foi preparar um lugar para mudarmos), não levei bronca maior.

Continua... No próximo Texto.

João Bezerra da SILVA NETO - COLUNISTA DO DIVULGA/ESCRITOR

e-mail: João.digicon@gmail.com

 

 

 

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