Pipoco Azul - por Anchieta Antunes

Pipoco Azul - por Anchieta Antunes

                           PIPOCO    AZUL

 

Aconteceu ontem. Após alguns anos dormindo na furna do esquecimento, minhas habilidades “eletricisticas” voltaram à tona. Por imperiosa força da necessidade, de conforto, tinha que reinventar minhas aptidões de “mestre eletricista”.

            O fio ( ou cabo, como querem os profissionais) estava curto de tanto se tirar  pedaços descascados, e fazer emendas, um perigo iminente de provocar um curto. Resolvi, com garbo e coragem dar fim àquela situação de angustia a cada vez que ia acionar o interruptor. Se eu sabia fazer, ainda o sei, é só uma questão de memória recolhida e que deve ser desfraldada nos varais de meus anseios. Na mão: estilete (com lâmina enferrujada) chave de fenda, alicate, fio ou cabo, uma tomada de corrente nova (a que estava em uso tinha, pelo menos dez anos), e uma dosagem extra de cautela e paciência.

            Olhei, olhei e olhei mais uma vez, um medo do cão de levar um  choque. É claro que estava tudo desligado, não havia como ser “chocado”. Comecei a operação       “CONFORTO    NO     QUEBRA    LUZ” , ou, preguiça de um ancião cansado. Óculos a punho, digo, no rosto, luz acesa, ferramentas ao lado e que a memória retorne a tempo de consertar um desconforto.

            Tirei parafusos, descasquei fios, enrolei em outros fios, isolei com fita isolante, verifiquei se não havia nenhum brilho de metal perto de minhas mãos. Nada; tudo perfeito. Mais parecia uma sinfonia inacabada, uma bateia cheia de duvidas, e o brilho no olhar esperando enxergar uma chispa azul brotando da tomada, e o zumbido característico de um curto, seja ele pequeno ou longo, o perigo é o mesmo.  Chegou o momento de inserir na tomada os dois pinos de vida ou morte...

                                               QUASE   DEU   MORTE!!!

            O pipoco foi grande, retumbante e azulado; faíscas, raios nervosos, e um clarão instantâneo.  O mais feio é o barulho que faz, parece o prenuncio de um cataclismo; aquele som deformado por natureza ficou ribombando em meus ouvidos como se fosse culpado da vida na terra.

            Minha mão ficou chamuscada, os nervos sensíveis, a culpa rodopiando em torno de minha cabeça que também rodava como um pinhão de madeira. Vi-me obrigado a derramar meus pecados no Box do banheiro, sob a água do chuveiro que lavava as partes roxas, a mão danificada prestes a sofrer o procedimento magno da amputação. _Como viverei sem uma delas? (mão) Perguntava-me angustiado. E eu mesmo respondia:_Ainda bem que foi a esquerda e eu sou destro. Vou continuar podendo desenvolver quase todas as minhas atividades motoras. E o amigo da onça pergunta:_E pra cortar carne como vai ser?  _Não vai ser, incréu, vou ter que pedir a alguém que o faça por mim. Nem tudo é perfeito. Sempre tem uma rocha pontiaguda tentando solapar nossos caminhos para a luz.

            Finalmente consegui aumentar o fio do meu quebra luz de cabeceira sem ter que amputar nada; era só um pequeno corte que levei quando descascava o fio para emenda. Tudo funcionando direitinho, com luz abundante, com minha leitura garantida, com meus livros de cabeceira bem acomodados sobre a mesa ao lado da cama.

            O pipoco que ouvi não passou de um ensaio da banda do colégio perto de casa, treinando pra o 7 de setembro. O menino do tambor tem uma força incrível. O tambor tende a ser perfurado com o entusiasmo do moleque da banda. Dá para perceber que o 7 de setembro vai ser bastante barulhento, mas o que importa é que já estou com minha luz particular em pleno funcionamento, minha leitura garantida. Pipoco azul é o cacete, eu quero é luz...

 

Anchieta Antunes

Gravatá, 21/12/13

 

 

 

 

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