Ricardo de Moura Faria - Entrevistado

Ricardo de Moura Faria - Entrevistado

Esta entrevista foi publicada, originalmente, no FLAL – Festival de Literatura e Artes Literárias, em maio de 1917.

 

Ricardo de Moura Faria é natural da cidade mineira de Dores do Indaiá. Reside, atualmente, em Belo Horizonte, onde trabalhou como professor de História por 35 anos e culminou sua jornada como Consultor da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais para as áreas de Educação e Cultura.

Escreveu, isoladamente ou com coautores, mais de setenta obras didáticas e paradidáticas. Sua produção foi, inclusive, objeto de tese de doutoramento defendida por um ex-aluno.

Por algum tempo foi também fotógrafo, tendo realizado quatro exposições, todas em Belo Horizonte.

Aposentado, enveredou pelo ramo da literatura, com um projeto que germinava havia mais de dez anos, agora publicado.

 

Pesquisas afirmam que uma grande parte dos brasileiros lê quatro livros por ano; o que um escritor pensa sobre isso?

Ricardo Faria – Eu não penso, eu tenho certeza de que algo vai muito mal neste país. E tenho até medo de perguntar quais são os quatro livros que alguém lê em um ano. Quem lê aprende a escrever melhor do que assistindo aulas enfadonhas, sendo obrigado a decorar regras e mais regras. Não é preciso isso, basta colocar livros nas mãos das crianças desde que elas aprendem a ler, incentivar cada vez mais a leitura nas escolas. Mas as escolas conseguem transformar o ato de ler num martírio... Os professores querem respostas padronizadas sobre a leitura, esquecendo-se de questionar as emoções dos alunos sobre o que leram. Então, fechando a resposta: é assustador saber que tão pouca gente no Brasil é capaz de ler.

 

Acha que a Literatura Brasileira está tendo mais oportunidades? Se sim, quais?

Ricardo Faria – Eu diria que hoje temos milhares de pessoas publicando, seja nas plataformas digitais, seja por meio de editoras que descobriram este filão, como explanarei em outras questões desta entrevista.

A pergunta que fica no ar é: estamos falando de Literatura ou de mera escrevinhação?

Eu andei ganhando e comprando muitos livros de autores e autoras que publicaram nos dois últimos anos. E lhe digo, com toda sinceridade, que há muito lixo misturado com grandes histórias.

E o público que está consumindo ou tendo acesso gratuito a essas obras, será que está sabendo discernir?

E até que ponto essa profusão de escrevinhações, seja de autores, seja de ghost-writers ligados a youtubers, contribui para que muitos continuem acreditando que a literatura brasileira é ruim? Este é um comentário que se ouve muito nos corredores das bienais: “Não gosto de autores nacionais”. E lhe digo que as editoras também estão se lixando para eles, preferem publicar e jogar todas as fichas da divulgação em autores estrangeiros, muitos dos quais são lixo também.

 

Como você se sente ao ver seu trabalho reconhecido e elogiado pelos leitores? O que espera passar para os leitores com isso?

Ricardo Faria – Creio que a sensação é a mesma de qualquer escritor, não teria como ser diferente. É sempre gratificante quando temos leitores que realmente leram do princípio ao fim, gostaram e elogiaram, seja pessoalmente, seja postando nas redes sociais. O que não gosto é quando percebo que a pessoa não leu e, cheia de preconceitos até mesmo religiosos, começa a colocar comentários nas resenhas.

 

Quais suas metas daqui para frente? Alguma outra história em andamento?

Ricardo Faria – Sim, tenho. Percebi que não dá para parar. Então já tenho hoje aquele que será o segundo volume deste romance que publiquei. E estou à procura de uma editora séria, pois de editoras que fingem ser editoras estou cheio! E, além desse, já tenho também um outro livro, mais voltado para o público infanto-juvenil, também pronto e revisado, faltando algumas ilustrações.

 

Como leitora, fico muito triste quando estou lendo algum livro e vejo erros de português, erros de digitação ou incoerências e sinto em constatar que são obras publicadas por editoras, não de forma independente. O que você, escritor, acredita que leva uma editora a fazer um trabalho tão ruim e ainda publicá-lo muitas vezes prejudicando uma história boa?

Ricardo Faria – O problema é que muitas editoras descobriram um enorme filão para ganhar dinheiro neste nosso país. Como? Não gastando um centavo para produzir os livros. Mas não gastam MESMO! E revisão e correção são atividades caras. As pessoas especializadas nisso não cobram barato, porque é uma tarefa difícil e delicada. É preciso compreender que o revisor não é um ditador. Ele aponta o erro, sugere, mas está sempre disposto a dialogar com o autor para que, ao final, o texto esteja perfeito. E isso é caro. Por isso as editoras não o fazem. Nem a revisão técnica andam fazendo, aquela que vai observar se na diagramação não “sumiu” alguma letra ou palavra, ou se um hífen aparece no meio da página.

Eu tenho lido alguns livros de novos autores que realmente me deixam embasbacado com a quantidade de erros, e quando você vai lá à página onde se colocam os dados da produção e procura quem foi o(a) revisor(a)... não acha, porque não tem.

 

Conte um pouco de suas experiências ao enviar seus originais para aprovação de uma ou mais editoras. Há autores que acreditam que seus textos não são lidos, e que passado um tempo, elas mandam a resposta de recusa padronizada. Isto ocorre com você também?

Ricardo Faria – Estou entrando nessa seara agora. O que posso falar a respeito, portanto, é o resultado de minha experiência. Não foi algo agradável. Enviei o original para uma editora tradicional, respeitada no mercado livreiro, tive a promessa de receber a resposta em aproximadamente três meses. Seis meses se passaram. Enviei um e-mail questionando, não obtive resposta. Mais três meses, novo e-mail e já deixando claro que queria enviar o livro para outra editora, mas não o faria por uma questão ética, eu precisava ter a resposta. Que fosse negativa, porque era isso que eu imaginava, dado o silêncio. Continuei sem resposta. Ou seja, um ano após ter vencido o prazo de três meses que eles próprios definiram, eu continuava sem resposta. Não tive alternativa: enviei outro e-mail considerando que o silêncio significava recusa e, portanto, eu me considerava livre para apresentar a outra editora.

Foi o que fiz, e tive a surpresa de ser aceito. As condições eu considerei meio draconianas, mas entendi que, sendo o primeiro romance de minha autoria, eu teria de me submeter.

Até hoje não vi praticamente divulgação nenhuma feita pela editora. Tudo que consegui foi graças às amizades, familiares, ex-alunos e agora estou batalhando nessas feiras. Vamos ver se o resultado melhora!

 

Alguma vez você aprendeu algo com uma crítica? Se aprendeu, isso mudou seu jeito de escrever?

Ricardo Faria – Críticas sempre são bem-vindas, não apenas as elogiosas. E tive a sorte de receber uma crítica de um amigo que é editor, tem uma editora em São Paulo. Ele fez uma leitura atenta do meu romance e me sugeriu, principalmente, reduzir o tamanho do livro. De fato, ele ficou com 544 páginas e está difícil encontrar pessoas dispostas a ler esse calhamaço.

Resolvi atender à sugestão dele. Repito: ele sabe do que fala, porque é um editor. É sempre importante saber o “lócus” de quem fala.

 

Por que é tão difícil publicar e divulgar seu trabalho? O que deve ser feito para mudar a maneira de agir das editoras com os escritores?

Ricardo Faria – Pela minha experiência pessoal, publicar não é difícil. Basta você pagar para ter o livro impresso. Ou então você o publica digitalmente nos Wattpad, Amazon, Kindle, PerSe, Clube de Autores etc. etc. etc.

A questão chave é o que vem a seguir e que, em minha opinião, é o mais importante de tudo: como divulgar o que publicamos?

Você pode publicar anúncios nos jornais, pode conseguir falar nas rádios, pode até conseguir ser entrevistado por alguma rede de TV. Sabe o preço? Nem queira saber!

Restam as redes sociais. E eu já perguntei uma vez no Facebook e não tive uma resposta: os autores estão interessados em curtidas ou em vendas de seus livros?

Como fazer as editoras mudarem sua atitude? Não vejo como. Afinal, no mundo capitalista o que interessa às editoras é o lucro, não os autores...

 

Em sua principal ou primeira obra, os personagens são fictícios ou reais? De onde veio sua inspiração para criar os personagens principais?

Ricardo Faria – Bem, por enquanto só tenho uma primeira obra publicada. E posso garantir que todas as personagens são fictícias, mas muitas guardam semelhanças com pessoas que conheci.

Não foi sem propósito que escrevi na contracapa do livro: “As personagens são ficcionais, porém, nelas se percebe algo familiar, pois traduzem muito da experiência de vida do autor e de muitos que presenciaram aquela tumultuada fase de nossa História. Portanto, alguma semelhança talvez não seja mera coincidência”.

 

Ao escrever, a escolha dos temas tem a ver com a sua realidade (o que vivenciou)?

Ricardo Faria – Sim, como afirmei na questão anterior, o romance tem uma natureza histórica. A ação se passa em 1971 e 1972 e as pessoas da época viviam sob o pesado manto do Ato Institucional nº 5 (AI-5). E o tema é justamente este: o relato de experiências amorosas numa época de ditadura. A questão que coloco na boca de uma personagem é: “Será que a liberdade sexual é o contraponto da falta de liberdade política?”.

Eu vivi esse período. Era estudante, fazia o curso de História na UFMG, tinha 21 anos em 1971. Não pude ler centenas de livros, que foram censurados, fiz uma viagem à Amazônia que me mostrou um mundo que eu não conhecia, que nem parecia o Brasil, tive de responder inquérito policial por atitudes tomadas na direção do Centro de Estudos, vi colegas “desaparecendo”, soube de colegas presas e torturadas...

Este é o cenário do livro, e tem tudo a ver com o que vivenciei.

 

 

 

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