Desbravando os Caminhos de Portugal - por Lígia Beltrão

Desbravando os Caminhos de Portugal - por Lígia Beltrão

Desbravando os Caminhos de Portugal

 

       O dia tem preguiça de acordar. Continua, creio, embevecido pela lua cheia e o sol deverá se demorar um pouco mais a admirando, enquanto ela se exibe orgulhosa e despudorada, para que o mundo veja seu brilho de gozo ao alumiar a noite serena, até ir dormir, lânguida e sedutora a fazer inveja às deusas do universo. Assim acaba-se a noite, mas o dia não amanhece. As nuvens cobrem os cabelos das montanhas, que vestidas de verde exalam aquela mistura de perfumes, que só nessas terras encontramos. A mistura de eucaliptos, lavandas e mimosas flores, ditas brabas, mas que de brabas nada têm, pois são delicadas e coloridas distribuindo as cores de que o tempo carece para fazer-se perfeito. Eu sigo ouvindo o gemido das pedras que vestem a estrada e tenho medo de acordar desse sonho, que tenho o privilégio de viver.

       Aqui e acolá ouço o choro de saudade das águas que gemem, e que, nascendo nas montanhas despencam e seguem o curso do seu destino sem dar-se conta da sua importância.  Fontes, inúmeras, dão a certeza da vida e se encarregam de matar a sede aos que delas se achegam. Os cheiros impregnam o ar e o vento frio acaricia o meu rosto num atrevimento sem pudores. As margens da estrada, coloridas de flores, mostram a presença de Deus e se enfeitam de primavera. Diante de tanta beleza viro quase uma abstração de mim mesma, nessa viagem que faço encantada, muito mais ao derredor de mim do que do tempo que tange as horas, ou pelos caminhos majestosos da simplicidade dessas aldeias, que os meus olhos embevecidos, se enamoram e brincam de sorrir, enquanto eu, inteira, chamo-me de felicidade.

       São lugares pitorescos e únicos. Seu povo valente planta o que come e cria seus animais com um carinho sem medidas. São tradicionais. Carregam orgulhosos, no sangue e no peito, o jeito de viver de Portugal, enraizados no cerne do amor que sentem por essa terra gloriosa. E assim vivem sob as bênçãos de todos os Santos desse mundo.

       Os nomes das aldeias, tão peculiares, deixam-me maravilhada. “Mal Partida, Terra da Gaga, Olho Marinho, Cova do Ouro, Trezói, Vale do Além”, - e não é nome de cemitério não -, são pitorescos e fazem-me sentir um amor imenso pelos lugares e pelas pessoas que os habitam. Cada serra que se sobe tem-se a impressão de estarmos a caminho do céu. Delírios dos ventos que gemem de gozo fazendo amor com as matas.

       Há no ar cantigas de Fados. Gargalham os rios que seguem correndo vida adentro. Histórias tantas que são contadas e guardadas como relíquias, nas vidas e nos corações desse povo único. Estradas sinuosas me fazem pensar nas curvas que a vida tem. Sou desafiada pelo instante a desnudar-me por inteiro. Sentimentos aflorados, como os campos desta terra que ora acaricio com os pés. A vida lateja nas minhas veias e faço-me única. Neste momento não consigo definir-me, pois os pensamentos são desconexos e tento ser uma artesã das palavras, onde junto às letras para dar sentido ao meu tímido desejo de extrapolar-me.

       Louca! – diríeis -, não, apenas uma mulher que humaniza pedras e transforma as flores dos campos em poesias vivas. Invoco os deuses que sobrevivem imaculados e soberanos, em cima da palavra, cume dos gigantes e imortais Florbela Espanca, Fernando Pessoa, Miguel Torga e tantos outros que penso, ainda caminham pela terra que os pariu. Jogo de incoerências dentro de mim. Corro das flores para a navalha afiada, a palavra, e procuro esculpir o que me vai à alma, na lentidão das horas que me sufocam. Sinto o prazer em transitar por essas estradas incógnitas, nessa desembalada carreira do trem da vida. Mesmo submersa na saudade sou uma obstinada no caminho escolhido...

 

 

 

 

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